conselho de amigo

Ao acompanhá-lo à porta, ainda lhe disse:
— Então, não me dá nenhum conselho?
— Oh — respondeu-me, — eu sou um homem pacato, um bruto sem instrução… De que valem os meus conselhos?… Mas não ferva em pouca água… Na verdade, não sei porque se aflige tanto. Não vejo razão para isso, palavra de honra! — murmurou afável e num tom de sinceridade, procurando acalmar-me como se eu fora uma criança.
— Como, não vês a razão?!… Os mujiques arrancam os telhados das isbás para darem de comer ao gajo e consta que lavra uma epidemia de tifo…
— E daí? Pró ano haverá nova colheita, tornarão a pôr telhados e, se nós morrermos de tifo, outros hão-de viver depois de nós. A morte é certa, agora ou mais tarde. Em boa verdade, não vejo razão para isso… Não se aflija, meu velho!
— Não posso deixar de me afligir, — respondi-lhe, irritado.
Estávamos numa antecâmara mal iluminada. Ivan Ivanitch agarrou-me, de súbito, um braço e, preparando-se sem dúvida para me dizer algo de muito importante, fitou-me nos olhos durante alguns segundos.
— Pavel Anndreitch — disse-me, brandamente, e na sua cara empapada de gordura, nos seus olhos tristes, apareceu de novo a expressão particular com que ele outrora fascinava as pessoas, — Pavel Anndreitch, permita-me que lhe dê um conselho de amigo: modifique o seu feitio! É dificil tratar consigo! Meu caro, é difícil!


Anton Tchekov, A minha mulher
versão de Luiz Pacheco
Quasi Edições

~ por salamandrine em Junho 11, 2008.

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